quarta-feira, 26 de abril de 2017

motivos

Porque quando eu era criança gostava de brincar de bola, andar de bicicleta, bola de gude, coisas que na minha infância era sinônimo de lesbianidade – uma menina que brinca de coisas de menino. Eu não tinha primas da minha idade, só primos, então a gente brincava mais de coisas de menino mesmo e era sempre mais legal, pois “brincadeira de menino” tem mais aventura, mais descobertas e disso toda criança curiosa gosta. 

Porque eu cresci numa cidade onde as mulheres que chegaram em uma certa idade e não tem namorado são encaixadas em três categorias: 1. Sapatão. 2. Beata de igreja. 3. Rapariga que namora homem casado, por isso esconde.

Porque os meninos podem tudo. As meninas não. Elas precisam aprender a cozinhar cedo, arrumar a casa, cuidar do corpo, ser inteligente e tirar boas notas. Os meninos não. 

Porque muitas mulheres são mortas todos os dias (na minha cidade várias já foram) por ciúmes e por não serem o que os seus maridos queriam que elas fossem. 

Porque eu percebi que isso estava errado e que só porque faz parte da cultura eu considerava normal, eu me dei conta de que pra eu entender e pra não ser mais conivente eu precisava seguir uma doutrina que me ensinasse a lutar por direitos mínimos iguais e que me ajudasse a entender que essas coisas não são normais.

Porque eu quero que as crianças brinquem. De boneca, bolinha de gude, carrinho, casinha. Sem distinção de gênero. Quero também que a menina possa escolher namorar ou não, se casar ou não, dar pra quem ela quiser ou não. Quero me redimir com as meninas da minha cidade que eu julgava por ficarem com quantos meninos quisessem. 

Porque eu quero que as pessoas parem de julgar. As meninas não podem beijar mil bocas, mas os meninos se ainda forem virgens aos 15 anos são imediatamente chamados de gays e se realmente forem gays, ninguém comenta sobre, porque é proibido ser gay (até aqui, ser "comparado" a mulher é sinônimo de fraqueza). Sim, estamos falando do século 21 ainda.

Porque eu não quero que as pessoas dessa geração ganhem rótulos antes mesmo de saberem quem são. Porque eu preciso que as meninas da minha cidade se reconheçam e mostrem pra quem quiser ver (e quem não quiser principalmente) que elas podem fazer tudo o que elas quiserem. Porque as regras que inventaram prendem a gente numa ideia de que somos limitadas, quando na verdade quem decide o quão longe podemos ir somos nós e ninguém pode nos tirar isso.

É por tudo isso que hoje eu sou o que antes eu condenava: sou feminista. Eu condenava por não saber do que se tratava, assim como sei que muita gente condena. Então, querido leitor, se você chegou até essa parte do texto, eu peço que reavalie seu modo de pensar e tente enxergar e lutar por uma realidade melhor pro lugar onde você vive.

domingo, 23 de abril de 2017

se ame e se venere

O padrão acaba com a gente. A gente quer ser magro, alto, cintura fina, peitos fartos, bunda grande, barriga negativa – o tempo todo. A gente quer pintar os fios brancos, esticar as rugas do rosto, depilar a laser, fazer lipo, fazer drenagem, perder 10 quilos em um mês, entrar no tubinho preto P, calçar 36, colocar salto 15 e quem sabe crescer uns dois centímetros. A gente não tá satisfeito com nosso corpo e a gente nem para pra se questionar o motivo disso, o padrão aprisiona a gente, o que a gente vê na televisão, revistas, internet, aprisiona nosso estado natural de beleza, porque não sabemos o que de fato é real e o que é inventado pra gente acreditar.
A gente nasceu lindo. Cada um com um quilo ou dois a mais, linhas de expressão mais evidentes, pele flácida, braços fofos. A gente nasceu e se esquece disso. A gente está vivo e se esquece disso. São tantas as nuances de beleza, são tantas as qualidades que ficam invisíveis quando a gente acha que o mais importante está no número da calça ou na papada aparente. A gente é tão bonito, por que é mais fácil acreditar que não? Por que dar mais atenção a uma  crítica vazia que a um elogio cheio de verdade e estima de melhoras?
Não tem problema engordar dois quilos se você respeita os mais velhos. Não interessa se as pessoas dizem que você é feio sendo que você tem consciência de que é importante cumprimentar de volta quando alguém lhe sorri. Entenda que é preciso reconstruir o seu eu, acreditar na sua força e no que tem dentro do seu coração, porque sentir-se bonito de dentro pra fora é a maior riqueza que alguém pode conquistar. 
Quando a gente entende que a beleza é intangível, que vai muito, mas muito além de perspectivas e padrões que nos colocam, que transcende os comentários maldosos, a gente renasce. Descobrir o amor por si próprio e por todas as particularidades que cada um carrega, traz o sabor da vida de volta. A gente nasce bonito, a gente nasce querido, quem disse que a gente precisa ser bonito pros outros não sabe a grandeza, a leveza, a liberdade e a clareza que é ser bonito pra si mesmo.

quinta-feira, 20 de abril de 2017

a adolescência catuaba

As pessoas não tem interesse nas coisas, principalmente os adolescentes. Tudo bem que a internet é recente, ok, dá pra entender, mas são tantos os meios de pesquisar as coisas, de tentar entender o mundo, que eu fico muito irritada quando eu vejo pessoas sem o mínimo de interesse em saber o que está acontecendo ao redor delas. Guerras, destruição, políticos sendo desmascarados, mas a galera só quer saber de tênis branco e Counter Strike.
Puta que me pariu (mami, sem ofensa), tá normal namorar todos os migos da escola com 13 anos, tá normal engravidar duas meninas, assim como tá normal chegar em casa bêbado depois de uma noite loucona com os migos aos 13 anos, por que ao invés de chegar pra ajudar a resolver a equação de Bháskara, a era “vem de zap” tá chamando pra fazer batida de catuaba, tudo isso aos 14 anos recém completados.
Adolescente gosta de viver perigosamente, se sentir o pica do rolê e o caralho, a internet deveria servir pra informar que o consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes compromete o sistema nervoso central e que as pessoas que começam a beber antes dos 15 tem mais facilidade de desenvolver dependência química futuramente e ainda pensando na vida adulta, o uso de álcool na adolescência é associado ao maior consumo e abuso de outras drogas.
Sair de casa, morar longe dos pais sempre foi o divisor de águas entre a infância e maioridade, porque a partir dali é que se ia aprender a se virar sozinho, a fazer uma comida, a lavar a própria roupa, enfrentar desafios básicos de convivência – conhecer novas pessoas – e tentar se relacionar de uma forma que a existência não seja apenas mais uma interrogação.
Eu precisei, mas não é todo mundo que precisa, tem gente que já vai crescendo com aquela maturidade like Maisa, que se diferencia no meio da multidão e tem noção do que veio fazer no mundo, eu não tinha (nem sei se ainda tenho), mas meu ponto é: eu fico intrigada com a falta de interesse das pessoas em descobrir, entender, aprender, inovar.

Poderíamos estar mais atentos às mudanças climáticas, dar aquela respeitada no meio ambiente, tratar bem nossos pais, comer mais verduras, dar umas voltinhas de bicicleta, sair da zona de conforto, parar de querer ser igual, fazer o que os outros fazem só pra se incluir na rodinha, é mais difícil ser diferente, eu sei, mas é tão bom sair da bolha e tentar coisas novas, traz uma sensação de liberdade, recomendo.  

domingo, 16 de abril de 2017

não tenho certeza





Taurina com ascendente em Áries e lua em Libra. Talvez eu soubesse o que isso significa se não perdesse o interesse pelas coisas na metade. Talvez eu não parasse as coisas pela metade se eu fosse menos preguiçosa. Se eu não fosse preguiçosa, talvez eu tivesse lavado todas as minhas roupas que eu acumulo ao pé da cama. Se esse fosse o problema, ok, porque as roupas eu poderia só jogar na máquina e deixa-las estragar com o peso do tempo. Mas talvez eu ficasse com um pouco de arrependimento de deixa-las estragar com a voz de mainha lá no fundo “você não sabe quanto custa!!!”. Talvez o peso na consciência suma um pouco quando eu preciso muito do chuveiro quente batendo nas minhas costas, e esqueça um pouco da consciência coletiva. Talvez eu precisasse de mais um tempo pra pensar no motivo de eu tomar banhos tão quentes mesmo nos dias de calor e novamente, não ter nenhum tipo de remorso com relação a isso. Talvez eu me esquecesse de tomar banho quando tá muito frio e usasse a desculpa de que eu nem saí hoje, to bem limpinha ainda. Talvez eu ficasse com receio de falar que eu não tomei banho uma vez no frio e as pessoas pensassem que eu não tomo banho nunca. Talvez eu ligasse o foda-se, porque todo mundo sabe que eu detesto o frio e minhas articulações não funcionam direito nessa época. Talvez eu seja um pouco contraditória, pois mesmo não gostando de sentir frio eu tomo muito sorvete e cerveja no frio e tô nem ai, se gripar gripou, é o que dizem. Talvez eu tivesse​ muito medo de adoecer e ficasse pesquisando no google toda vez que sinto uma leve pontada no peito, mas tivesse tanto medo de hospital que preferiria não alardear tanto. Talvez eu nem soubesse mais quando foi que tomei a última vacina, não só por procrastinar, mas por ter medo de agulha também. Talvez se eu não fosse tão medrosa eu não deixasse meu cartão de vacina sumir. Talvez se eu não fosse tão desorganizada, eu conseguisse encontrar também a cartinha que meu avô escreveu no meu aniversário de oito anos, mas talvez se eu encontrasse poderia ser um pouco difícil pra mim. Talvez se eu não me concentrasse tanto nas minhas tristezas elas sumissem aos poucos. Talvez se eu mudasse de assunto eu conseguisse me lembrar porque comecei a escrever esse texto. Talvez as coisas não sejam tão difíceis como a gente pensa e as respostas pras nossas indecisões estejam dentro de nós, né?

sábado, 15 de abril de 2017

avesso

As possibilidades de enxergar o outro são inúmeras, mas o outro é, antes da minha percepção, alguém que se intitula, se rotula e eu não tenho nada com isso. A minha visão do “quem é você” não interfere na sua vida nem na vida de ninguém que eu, por ventura, queira classificar.
O que você faz ou o que deixa de fazer só interfere na vida do outro se você resolver que vai extrapolar os limites da liberdade. Você se isenta de críticas quando não toma partido, mas o que seria de você sem tomar parte de alguma coisa? O que você faz? O que você é se não tem algo em que acreditar?
Não é preciso ter opiniões formadas, mas é preciso ter no que acreditar, mas nenhuma dessas questões envolve o “ter que intervir na vida, opção, intelecto, alternativa (...) de alguém”. Nada é verdade se isso for observado a partir de um único ponto de vista. Ninguém é uma única coisa. Ninguém sabe de tudo.

 As pessoas têm que deixar de cavar raso e meter a broca nas aparências. Ir fundo, perceber (do infinitivo latino percipere, que significa “apreender pelos sentidos") que tudo é uma questão de sensibilidade. Todas as coisas são o que são. Mas as pessoas não. As pessoas estão. E isso muda todo o contexto, todos os rótulos, todas as premissas e todas as verdades.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

pontos de vista

Existem pessoas que gostam de sair e se divertir a noite inteira, tem gente que não gosta muito de sair de casa. Algumas amam tatuagens, outras não cortam o cabelo, muitas pessoas tem medo de altura e de sapo, algumas outras não tão nem aí se é inverno ou verão, pois não existe estação ideal pra jogar vídeo game o dia inteiro. Aquelas que gritam e as que falam baixinho, as que encontram beleza em tudo e as explosivas, as carentes de atenção e as solitárias, que gostam de ler livro debaixo de árvores. Existem vários tipos de pessoas, que escolhem preferências por vontade ou por insistência de um amigo, que resolvem mudar de hábitos, ou os que estão muito bem assim. Aqueles que preferiam nem ter levantado da cama, mas que não se arrependeram por que era dia de sorvete grátis na Ben & Jerry's e valeu a pena ter levantado. Existem milhares de gostos. Existem milhares de vontades. A cabeça é um infinito de possibilidades, as pessoas crescem, se aprimoram, descobrem novos sentidos e sentimentos, e a partir das percepções de mundo elas apreendem novos hábitos, novas rotinas, afinal são oitenta e seis bilhões de neurônios trabalhando incansavelmente para segurar os aprendizados, pra colocar em prática a receita de bolo que alguém aprendeu na internet, pra criar um robô, pra tomar cerveja e filosofar sobre a vida com amigos ou sozinho na mesa de um bar. O mundo é outro infinito de possibilidades, as ideias estão aí, as oportunidades estão aí, é muito desperdício não tentar entender o que o outro quer dizer, porque a partir disso, novos mundos são criados, novas ideias surgem, novos espaços se abrem e aí os oitenta e seis bilhões de neurônios são cada vez mais úteis, não só pra colocar uma colher de comida na boca ou concluir as 3 repetições de 15 levantamentos de peso de 40 quilos cada que dá aquele tônus lindo nas pernas, mas também pra criar invenções e tirar a gente daquele quadrado que a gente se esconde e se fecha e não quer mais saber de nada. Ignorar as experiências que o mundo (as pessoas, a vivência, os encontros) nos oferece é apagar dentro de si as possibilidades de recomeço e os incríveis novos mundos que podemos criar a partir disso. Não ignore, se abra, se permita, se encontre e faça das possibilidades um encontro consigo mesmo e com o universo que você vai criar.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

tudo doido de novo

Estamos sempre querendo expor nossas fraquezas, mesmo que inconscientemente, queremos aquele abraço despretensioso que anula qualquer incerteza, aquela ajudinha pra sair do fundo do poço, queremos colo, não julgamentos.
Expressar a fraqueza não quer dizer que não somos fortes, mas que podemos andar devagar segurados por muletas, porque não dá pra aguentar tudo o tempo todo, a gente tem o direito de ficar triste quando não vê nenhuma luz no fim do túnel. E quando colocamos isso pra fora, a gente não quer ouvir "eu também tô assim", mas "calma, isso vai passar, você vai ver!".
Por mais que a gente saiba que vai passar ainda é difícil ser sóbrio e maduro o suficiente. O país em crise, a gente sem emprego, sem esperança de que tudo o que a gente sonha vai se realizar, porque não dá pra enxergar esperança, ta tudo muito nublado, e não tem ninguém com uma solução imediata que nos faça sentir que "agora vai", é tudo incerto e se a gente não confiar nos incentivos e na máxima de que as coisas sempre dão certo no final, fica difícil achar um sentido na existência.
Porque a gente quer ser alguém na vida, independentes, donos dos nossos destinos, quitadores das nossas próprias dívidas.

É muito difícil ter 20 e tantos anos e não conseguir ter nada além de um diploma (que também não serve pra nada) e algumas ideias e sonhos e esperanças de que tudo vai dar certo.